28/08/2012

As árvores (os arboricidas) I

Na minha cidade estão minguados os cuidados (profissional, ético, estético, moral,...)  pelas árvores.
Esta árvore caiu, morreu.
Existe um regulamento municipal de espaços verdes do concelho do Porto (sim, eu sei)  mas  constato
a ausência de cuidados do parque arbóreo que fomente a saúde das árvores. Qualquer um de nós observa os (seus) espaços exíguos, a falta de rega, as podas excessivas...
A arborização urbana é de vital importância, todos sabemos,  principalmente nos grandes centros. 
As árvores (seculares) das calçadas tendem a desaparecer, isso é um facto.  Assim como o legado de gerações passadas, para todos nós e vindouros. Irei aqui mostrar (noutros textos) o estado das nossas árvores. A começar no centro da cidade.
É tão dura e longa a noite da insensibilidade.



 Praça Filipa de Lencastre, foto de Maria Pereira

Praça Filipa de Lencastre, foto de Maria Pereira

Praça Filipa de Lencastre, foto de Maria Pereira

Arca D'Água

Há nomes mágicos, dizias tu, falando-me de lugares, pessoas, coisas: berlinde, Sara, Abril, concha ou jardim. Eu acrescentava: arca d'água, lembrando-me de um parque, altos plátanos, a continental cidade do Porto, azulejos amarelos entre o granito enegrecido pelos fumos.
As «ilhas» fugiam, numa paisagem de corredores estreitíssimos, celhas com a roupa da barrela, crianças e galinhas esgravatando a terra, humidade onde crescia o bolor e trepavam cogumelos. Arca d`Água ficava longe do centro e do rumor dos cafés. Alguém chorava junto a um dos plátanos.
Era um lugar de encontros clandestinos onde se trocavam pequenos jornais e palavras a meia-voz; onde se inventava a esperança desses dias. Mas, ao longe, afinal tão perto!, barcos partiam para a morte em terras d'África. Era a guerra.
Há nomes mágicos, insistias. Eu voltava a falar-te na Arca d´Água, como se pudesse, com qualquer abracadabra, atrair o espírito do lugar, o génio da lâmpada, o «abre-te Sésamo» para, desta vez, sair da caverna e ver a Luz.
Na ampla praça os plátanos moviam-se num soneto de Sena. As lâmpadas acendiam-se mais perto, rasgando o nevoeiro que rosnava nos telhados e já chegava às soleiras das portas. Era outro Dezembro, outra praça, outra vontade.
Quem aparelhava os barcos da aventura? Quem poluía os lençois de linho de Pessanha? Quem escondia a imagem do Patriarca, chamando os animais para a Arca?
Arca d'Água repetia agora para mim próprio. E no sonho, maré alta, vogava em liberdade - Noé do princípio, criador de novos mundos.

Eduardo Guerra Carneiro,
in, Ao Porto Colectânea de Poesia sobre o Porto
Dom Quixote, 2001






 

4 comentários:

ana disse...

Maria,

É impressionante que se desvalorize o que há de mais belo na Natureza. A altivez, a postura, a sombra e os cheiros que as árvores nos dão (para não falar no oxigénio) são beleza!

Lamentável que se desprezem as árvores.
Boa tarde!:)

C. Cardoso disse...

Olá Ana,

A consciencialização da necessidade e beneficios das árvores na malha urbana é cada vez maior. Falta civismo, cidadania participante e uma visão global para quem está no poder local e central. Um Xi.

mz disse...

O nosso olhar consciente para as cidades tem forçosamente de passar pelos espaços verdes. Infelizmente, temo que com os cortes finaceiros a todos os níveis e neste caso, das Câmaras Municipais, este problema se agrave e as todos os espaços ajardinados e arbóreo, passe para segundo plano.

Vamos estar atentos como cidadãos conscientes e, incutir aos que nos rodeiam, independentemente da idade, a responsabilidade continuada de que, uma árvore é mais necessária do que um espaço de estacionamento.

Não deixe morrer esta vontade!

Abç

C. Cardoso disse...

Cara Mz
Compartilho as suas dúvidas e esperanças. Grata pelas suas palavras e estímulo.
Um Xi,